A primavera é uma estação florida,
Cheia de imenso, divinal fulgor;
De flores enche o coração da vida,
E enche de vida o coração da flor.
Estou a escrever estas mal
digitadas linhas neste mês de agosto. Um mês que o meu lado supersticioso sempre aflora imperativamente.
Minha sorte está lançada.
Os fantasmas de agosto surgiam em nuvem
de poeira formada pela ventania que a todos atingia e cercava na subida da
Avenida J.J. Seabra quando a gravidade impunha e estatelava ao chão, ainda
sem paralelepípedos, muito pau d’água, cachaceiros contumazes de todos os
gêneros, raquíticos de todas estirpes, além dos estudantes do Cézar Zama e
do Senhor do Bonfim desafiantes dos redemoinhos que zuniam na famosa e
resplandecente avenida xiquexiquense do final dos anos sessenta.
Com arraigada mania de pescar, sobrevivi, num mês de agosto, a um naufrágio
de paquete nas imediações da Ilha do Paulista, quando o vento, que
soprava desde as dunas do Icatú, enfurecido por Eólo, partiu o mastro da
pequena e rústica embarcação arrastando-a para o fundo do rio.
Nas ditas circunstâncias, a esperança sempre se descortina com o
alvorecer do próximo mês de setembro, a rememorar as festas da primavera em
Xiquexique.
Foi numa festa da primavera que os professores do Colégio Municipal Senhor
do Bonfim destacaram alguns alunos para homenagear a estação
primaveril, tendo como sugestiva temática as plantas, flores e frutos.
Ergueu-se um palanque na Praça Dom Máximo.
Os alunos, escalados, haveriam de representar o script das plantas, flores e
frutos, conforme as incumbências do que lhes foram destinados a
protagonizar:
“Eu sou a Rosa, a rainha das flores, que perfuma todos os jardins da cidade” declamava um linda cabrochinha da 7ª série.
“Eu sou o Milho e tenho mil e uma utilidades”, discursava um colega, o primeiro da classe.
“Represento o Feijão, a riqueza da nossa região” rimava outro colega.
Todos, compenetrados, incorporavam os produtos nobres da nossa flora, desempenhando um papel
individualizado .
Sobrou pra mim, no entanto, o script para interpretar um personagem
que ninguém queria explanar, conquanto, soube depois, foi usado até
nepotismo para que os alunos privilegiados, filhos e netos da burguesia conservadora, deixassem de representar a
planta que me coubera por exclusão. Aquilo valia nota. Criei ânimo e com
coragem subi à ribalta. Fantasiado da planta que eu incorporava na
condição de artista coadjuvante, segurei firme o microfone
balanceado pelo radialista e sonoplasta Mário Velho, tomei a palavra e bradei
com altivez artística:
Nesse instante, uns gaiatos que
assistiam a cerimônia, “caíram” na risada e nos apupos. No microfone, embora
cortado o som, mandei todo mundo para o devido lugar, resultando-me, conseguintemente,
uma pena de repreensão do diretor do colégio e vermelho no meu boletim escolar, no item
comportamento.
Desnecessário dizer que desse dia em diante, desisti de ser ator.
Nilson Machado de Azevedo
Nilson Machado de Azevedo
3 comentários:
Xique-Xique só tem artista, né?
19/8/15 14:53É.
19/8/15 19:04Eu sou a menina que fez o papel da rosa.
19/8/15 22:31Eu era aluna do ginásio Sr, do Bomfim.
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